O HIV é um retrovírus com genoma RNA, da família Lentiviridae. Pertence ao grupo dos retrovírus citopáticos e não-oncogênicos que necessitam, para multiplicar-se, de uma enzima denominada transcriptase reversa, responsável pela transcrição do RNA viral para uma cópia DNA, que pode então integrar-se ao genoma do hospedeiro.
O HIV é bastante lábil no meio externo, sendo inativado por uma variedade de agentes físicos (calor) e químicos (hipoclorito de sódio, glutaraldeído). Em condições experimentais controladas, as partículas virais intracelulares parecem sobreviver no meio externo por até, no máximo, um dia, enquanto que partículas virais livres podem sobreviver por 15 dias à temperatura ambiente ou até 11 dias a 37ºC.
Ciclo vital do HIV na célula humana
1. ligação de glicoproteínas virais (gp120) ao receptor específico da superfície celular (principalmente CD4);
2. fusão do envelope do vírus com a membrana da célula hospedeira;
3. liberação do "core" do vírus para o citoplasma da célula hospedeira;
4. transcrição do RNA viral em DNA complementar, dependente da enzima transcriptase reversa;
5. transporte do DNA complementar para o núcleo da célula, onde pode haver integração no genoma celular (provírus), dependente da enzima integrase, ou permanecer em forma circular isoladamente;
6. o provírus é reativado e produz RNA mensageiro viral indo então para o citoplasma da célula;
7. proteínas virais são produzidas e quebradas em subunidades por meio das enzimas proteases;
8. as proteínas virais produzidas regulam a síntese de novos genomas virais e formam a estrutura externa de outros vírus que serão liberados pela célula hospedeira;
9. o vírion recém-formado é liberado para o meio circundante da célula hospedeira, podendo permanecer no fluído extracelular ou infectar novas células.
Formas de transmissão e prevenção
As principais formas de transmissão do HIV são: sexual, sangüínea (em receptores de sangue ou hemoderivados não testados e em usuários de drogas injetáveis ou UDI) e perinatal (transmissão da mãe para o filho durante a gestação, parto ou por aleitamento materno). Além destas formas, mais freqüentes, pode ocorrer também a transmissão ocupacional, ocasionada por acidente de trabalho, em profissionais da área da saúde que sofrem ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes infectados pelo HIV. Algumas considerações sobre essas formas de transmissão:
Transmissão Sexual
A principal forma de transmissão do HIV no mundo todo é a sexual, sendo que a transmissão heterossexual por meio de relações sem o uso de preservativo é considerada, pela OMS, como a mais freqüente do ponto de vista global. Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV numa relação heterossexual são: alta viremia, imunodeficiência avançada, relação anal receptiva, relação sexual durante a menstruação e presença de outras DST, principalmente as ulcerativas. Sabe-se hoje que, não só as úlceras resultantes de infecções por agentes sexualmente transmissíveis aumentam o risco de transmissão do HIV, mas também outras DST, mesmo as que causam corrimentos ou verrugas.
Os preservativos masculinos e femininos são a única barreira comprovadamente eficaz contra o HIV, e o uso correto e sistemático deste método pode reduzir substancialmente o risco de transmissão do HIV e das outras DST. O uso regular de preservativos pode levar ao aperfeiçoamento na técnica de utilização, reduzindo a freqüência de ruptura e escape e, consequentemente, aumentando sua eficácia.
Os produtos espermicidas à base de nonoxynol-9 são capazes de inativar o HIV e agentes de outras DST "in vitro" e poderiam ter seu papel na redução da transmissão sexual do HIV se usados em associação com os preservativos. Estudos recentes sugerem que a concentração de nonoxynol-9 normalmente preconizada nos preservativos seria insuficiente para inativar o HIV, sendo que o uso de concentrações mais elevadas poderiam apresentar toxicidade. Entretanto, a segurança e eficácia dos espermicidas atualmente disponíveis, nas condições de uso corrente, não estão bem estabelecidas e mais estudos clínicos controlados são necessários para esta determinação.
Transmissão Sangüínea
A transmissão por meio da transfusão de sangue e derivados tem apresentado importância decrescente nos países industrializados e naqueles que adotaram medidas de controle da qualidade do sangue utilizado, como é o caso do Brasil.
A transmissão sangüínea associada ao uso de drogas injetáveis é um meio muito eficaz de transmissão do HIV devido ao uso compartilhado de seringas e agulhas. Esta forma tem importância crescente em várias partes do mundo, como na Ásia, América Latina e no Caribe. No Brasil, esta forma tem importância crescente nas áreas rota do tráfico de drogas, sendo sentida principalmente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
A prevenção da transmissão por meio da transfusão de sangue e derivados se resume ao controle da qualidade do sangue e derivados pelos Bancos de Sangue. Os profissionais de saúde, ao vigiar e denunciar as irregularidades às autoridades sanitárias, desempenharão importante papel na prevenção e controle da transmissão do HIV, outras DST e de outras doenças que podem ser transmitidas pelo sangue.
Desde 1986 tornou-se claro que os usuários de drogas injetáveis (UDI) representavam um grupo focal particularmente importante, devido ao risco específico de ocorrência de epidemias de HIV nessa população e ao potencial de representarem a interface por meio da qual a infecção por HIV se difundiria para a população heterossexual não usuária de drogas, e consequentemente para as crianças.
A disseminação da infecção pelo HIV entre UDI em vários países, levantou importantes questões sobre a natureza do comportamento dos dependentes, e da possibilidade de modificá-lo por meio de intervenções preventivas, de modo a reduzir o risco de transmissão do HIV.
Houve ceticismo inicial acerca da eficácia de ações educativas nessa população. O temor de que a estratégia de redução de danos, baseada na facilitação do acesso a equipamento estéril de injeções, pudesse levar ao aumento da população de usuários de drogas, não se concretizou.
Atualmente há evidências suficientes para concluir que foi possível reduzir o nível epidêmico da transmissão do HIV em locais onde programas inovadores de saúde pública foram iniciados precocemente. Os elementos desses programas de prevenção incluem: orientação educativa, disponibilidade de testes sorológicos, facilitação de acesso aos serviços de tratamento da dependência de drogas, acesso a equipamento estéril de injeção, além de ações que se desenvolvem na comunidade de usuários de drogas, a partir de profissionais de saúde e/ou agentes comunitários, recrutados na própria comunidade.
Em relação às mudanças comportamentais, demonstrou-se que os UDI podem ser sensíveis às ações preventivas e capazes de reduzir a freqüência das situações de risco. Porém, se todos os estudos demonstram redução de risco, evidenciam, infelizmente, a persistência de níveis importantes do comportamento de risco, mesmo nas cidades onde se obteve razoável impacto das ações preventivas.
Transmissão Perinatal
A transmissão perinatal, decorrente da exposição da criança durante a gestação, parto ou aleitamento materno vem aumentando devido à maior transmissão heterossexual. A transmissão intra-uterina é possível em qualquer fase da gravidez, porém é menos freqüente no primeiro trimestre. As infecções ocorridas neste período não têm sido associadas a malformações fetais. Alguns estudos demonstraram que uma proporção substancial dos casos de transmissão do HIV da mãe para o filho ocorre durante o período intraparto, e seriam causados por:
- transfusão do sangue materno para o feto durante as contrações uterinas,
- infecção após a rotura das membranas,
- contato do feto com as secreções ou sangue infectados do trato genital materno.
Em 1994 os resultados do Protocolo 076 do Aids Clinical Trial Group (ACTG-076) comprovaram que o uso do AZT pela mulher durante a gestação, trabalho de parto e parto, e pelo recém-nascido por 6 semanas, pode reduzir a transmissão vertical do HIV em cerca de 70%. A transmissão pelo leite materno é evitada com o uso de aleitamento artificial ou de bancos de leite humano que fazem aconselhamento e triagem das doadoras.
Transmissão Ocupacional
A transmissão ocupacional ocorre quando profissionais da área da saúde sofrem ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes portadores do HIV. Estima-se que o risco médio de contrair o HIV após uma exposição percutânea a sangue contaminado seja de aproximadamente 0,3%. Nos caso de exposição de mucosas, esse risco é de aproximadamente 0,1%. Os fatores de risco já identificados como favorecedores deste tipo de contaminação são: a profundidade e extensão do ferimento a presença de sangue visível no instrumento que produziu o ferimento, o procedimento que resultou na exposição envolver agulha colocada diretamente na veia ou artéria de paciente portador de HIV e, finalmente, o paciente fonte da infecção ter evidências de imunodeficiência avançada (sinais clínicos da doença, carga viral elevada, CD4 baixo).
Embora alguns tipos de exposição acidental, como o contato de sangue ou secreções com mucosas ou pele íntegra, teoricamente possam ser responsáveis pela infecção, os riscos são insignificantes quando comparados com a exposição percutânea, por meio de instrumental pérfuro-cortante.
Fatores como prevalência da infecção pelo HIV na população de pacientes, grau de experiência dos profissionais de saúde no cuidado desse tipo de paciente, uso de equipamentos de proteção individual (luvas, óculos de proteção, máscaras, aventais, etc.) bem como a freqüência de utilização de procedimentos invasivos, podem também influir no risco de transmissão do HIV. O meio mais eficiente de reduzir-se tanto a transmissão profissional-paciente quanto a paciente-profissional, baseia-se:
- na utilização sistemática das normas de biossegurança,
- na determinação dos fatores de risco associados e na sua eliminação, e
- na implantação de novas tecnologias da instrumentação usadas na rotina de procedimentos invasivos.
Hipóteses de outras possíveis formas de transmissão
Embora o vírus tenha sido isolado de vários fluidos corporais como saliva, urina, lágrimas, somente o contato com sangue, sêmen, secreções vaginais e leite materno têm sido implicados como fontes de infecção.
O risco da transmissão do HIV por saliva foi avaliado em vários estudos laboratoriais e epidemiológicos. Esses estudos mostram que a concentração e a infectividade dos vírus da saliva de indivíduos portadores do HIV é extremamente baixa.
Dados laboratoriais e epidemiológicos não provêm qualquer suporte à possibilidade de infecção por HIV por qualquer das seguintes vias teóricas de transmissão: contato interpessoal não-sexual e não-percutâneo (contato casual), vetores artrópodes (picadas de insetos), fontes ambientais (aerossóis, por exemplo) e objetos inanimados (fômites), além de instalações sanitárias.
Conclui-se que formas alternativas de transmissão são altamente improváveis e que a experiência cumulativa é suficientemente ampla para se assegurar enfaticamente que não há qualquer justificativa para restringir a participação de indivíduos infectados em seus ambientes domésticos, escolares, sociais ou profissionais.
Aspectos Clínicos
A infecção pelo HIV pode ser dividida em quatro fases clínicas:
1. infecção aguda;
2. fase assintomática, também conhecida como latência clínica;
3. fase sintomática inicial ou precoce; e
4. aids.
Dúvidas frequentes
Atualmente, ainda há a distinção entre grupo de risco e grupo de não risco?
Essa distinção não existe mais. No começo da epidemia, pelo fato da aids atingir, principalmente, os homens homossexuais, os usuários de drogas injetáveis e os hemofílicos, eles eram, à época, considerados grupos de risco. Atualmente, fala-se em comportamento de risco e não mais em grupo de risco, pois o vírus passou a se espalhar de forma geral, não mais se concentrando apenas nesses grupos específicos. Por exemplo, o número de heterossexuais infectados por HIV tem aumentado proporcionalmente com a epidemia nos últimos anos, principalmente entre mulheres.
O que se considera um comportamento de risco, que possa vir a ocasionar uma infecção pelo vírus da aids (HIV)?
Relação sexual (homo ou heterossexual) com pessoa infectada sem o uso de preservativos; compartilhamento de seringas e agulhas, principalmente, no uso de drogas injetáveis; reutilização de objetos perfurocortantes com presença de sangue ou fluidos contaminados pelo HIV.
Qual o tempo de sobrevida de um indivíduo portador do HIV?
Até o começo da década de 1990, a aids era considerada uma doença que levava à morte em um prazo relativamente curto. Porém, com o surgimento do coquetel (combinação de medicamentos responsáveis pelo atual tratamento de pacientes HIV positivo) as pessoas infectadas passaram a viver mais. Esse coquetel é capaz de manter a carga viral do sangue baixa, o que diminui os danos causados pelo HIV no organismo e aumenta o tempo de vida da pessoa infectada.
O tempo de sobrevida (ou seja, os anos de vida pós-infecção) é indefinido e varia de indivíduo para indivíduo. Por exemplo, algumas pessoas começaram a usar o coquetel em meados dos anos noventa e ainda hoje gozam de boa saúde. Outras apresentam complicações mais cedo e têm reações adversas aos medicamentos. Há, ainda, casos de pessoas que, mesmo com os remédios, têm infecções oportunistas (infecções que se instalam, aproveitando-se de um momento de fragilidade do sistema de defesa do corpo, o sistema imunológico).
Quanto tempo o HIV sobrevive em ambiente externo?
O vírus da aids é bastante sensível ao meio externo. Estima-se que ele possa viver em torno de uma hora fora do organismo humano. Graças a uma variedade de agentes físicos (calor, por exemplo) e químicos (água sanitária, glutaraldeído, álcool, água oxigenada) pode tornar-se inativo rapidamente.
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